Todo floreiro encontra em algum lugar um tipo de flor que é raro, aquela que lhe nunca lhe passa sem chamar a atenção. Há quem diga que isso se chama amor, todavia é algo difícil de explicar em palavras rabiscadas em um quadro.

"A mais bela flor", é assim que poderia chamar aquela que é rara, que é única. É algo como a conversa da raposa do pequeno príncipe: "Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessiddade um do outro. Serás pra mim o único no mundo. E eu serei para ti a única no mundo".

Isso é belo, é raro, é unico, embora há quem diga que seja "viadagem". Todavia é preciso ter claro que esse sentimento é incoercível perante essas rotulações vazias. O fato de alguém ter ternura não faz dessa pessoa alguém fraco, na verdade, digo até o contrário: que negar seu sentimento perante a flor mais bela é a real fraqueza, é a negação de si mesmo, da própria identidade. Mas é compreensivel que tenhamos de fazê-lo muitas vezes contra nossa vontade, há muitos fatores externos que muitas vezes nos pressionam à  negação.

Nessa série inicio a reflexão que mais entra como um "chute no saco" dos floreiros, seja ele ou não um Zeca, a questão das flores que não envelhecem...
 
Continuando minha saga de Zeca, no complexo ano de 2002, me remeto agora a um curso de formação de um fim de semana inteiro, onde conheci a linda flor Abrótea. Antes que pensem que o Floreiro é um maníaco sexual disfarçado de bom cristão, afirmo que um cristão, como qualquer ser humano, possui sexualidade, é erótico e afetivo. Bem, isso pode dar um futuro Post.

Continuando, nesse curso de formação em que conheci Abrótea, encanetei-me com seu carisma, seu jeito brincalhão de ser e um detalhe extermamente significativo: ela era uma daquelas baxinhas pra lá braba.

Entre uma brincadeira e outra nos intervalos do curso, fui aos poucos aprendendo a fazê-la rir. Curiosamente, se há no senso comum a idéia de que é possível conquistar um homem pelo seu estômago, considero que é possível fazer uma mulher por suas bochechas e barriga: se você é capaz de fazê-la rir, com certeza tem um grande diferencial. E eu precisava disso, pois como ja disse, sou feio, e isso é difícil de contornar.

O bom Deus quis que eu cruzasse com aquela flor, pois a oportunidade perfeita apareceu naquela noite, em que faríamos uma festa do ridículo. E bem, numa festa do ridículo, até os feios tem chance estética com os bonitões. Foi aí que procurei Abrótea e disse-lhe que queria me fantasiar de mulher, mas precisava de uma maquiagem.

Um pequeno parênteses sobre a maquiagem: é uma arte milenar que faz das mulheres artistas do corpo e da alma. Com o adequado manuseio dos lápis, batons, sombras, pinças e outros tantos elementos, elas fazem de seu rosto uma obra prima. E elas são muito cuidadosas nisso: gastam um considerável tempo se produzindo, realizando sua obra prima. Por isso a gente às vezes fica tanto tempo na espera.

Voltando a maquiagem, Abrótea ficou euforica com a possibilidade de transformar-me em uma menina: mandou-me aparar a barba e lavar bem os cabelos, que o resto ela faria. Nesse momento pensava o que isso tudo significava, mas ainda não percebia que estávamos fazendo uma espécie de jogo em que os dois estavam ansisos pra saber qual seria o próximo passo. Banho tomado e barba feita, inicio a produção com Abrótea. Seus equipamentos deixaram meu rosto fantástico, levemente mulher, com sombras profundas, cílios armados, boca irradiante e face lisinha. Só o cabelo que não tinha ficado muito bom, mas o conjunto estava excelente.

Iniciada a festa, Abrótea se realiza com o sucesso de "sua menina": entro no desfile e faço a performance, gritos alucinados na geral. Até os Zecas ficaram imressionados com minha familiardade na pista.

Dançamos a noite toda, eu e Abótrea ficavamos oscilando entre danças próximas e afastamentos para nossos grupos. Ao mesmo tempo em que ficava excitado com a possibilidade de beijar seus lábios com minha boca de batom, temia que ela talvez dissesse não. E nessa bunda molice fiquei até o fim da festa, quando acabou a música era hora de ir dormir (meninos pra um lado, meninas para outro). Ciente de que era aquela a hora, ou nunca mais, aproximei-me de Abótrea para dar o beijo de boa noite e intencionalmente virei meu rosto de encontro aos seus lábios. Um leve beijo e ela me empurrou dizendo: "até que enfim!". Antes que pudesse pensar qualquer coisa, e ela virou as costas e saiu. Aquilo me deixou muito puto, mas ela podia ter suas razões, eu a tinha deixado esperando a noite toda.

Voltando pro quarto, os Zecas conversavam sobre suas meninas, e quando perguntaram-me se eu tinha conspirado, disse que não, querendo esconder minha vergonha de ter dado um beijo que passou rápido.

Dia seguinte, café da manhã, eis que estamos na mesa para tomar o café e Abótrea aparece, vem em minha direção e me dá aquele beijo de sair estrelas. Os Zecas me olham e dizem "safadão!". Não tenho nem onde enfiar minha cara.
 
Ainda em 2002 (nossa, como aconteceram coisas nesse ano), conheci uma bela flor do Colégio que era alta e esbelta, como um Copo de Leite. Seria uma garota sensacional, não fosse seu demasiado nariz empinado.

A conheci por um amigo meu, por quem ela ultra apaixonada. Mas meu amigo fugia dela como diabo da cruz. Eu, particularmente, não reparava muito nela até mesmo porque não queria encrenca com meu amigo, vai que ele ficasse p... da vida.

Certa feita saí mais cedo da aula (estudava de noite) e fiquei de bobeira na frente da lanchonete, onde peguei um salgado e fiquei pensando em que fazer, com preguiça de ir para a casa. Nisso, eis que ela me aparece e fica ali, perto de mim, dá um oi e meio que não fala nada. Sem bem entender o porque, pensei que talvez ela quisesse que eu tomasse alguma atitude de conversar com ela ou coisa do tipo, pois não tinha ninguém perto dela naquele momento a não ser eu.

Apesar do jeito esnobe, copo de leite foi interagindo com minha conversa sobre as aulas. Dei uns minutinhos e disse que estava indo embora, ela disse que também ia (???). Senti nessa hora que ela queria alguma coisa além de bater papo.

Aprendendo as lições da vida de Zeca, quando cheguei perto da esquina em que nos separaríamos, parei na frente dela e perguntei o que ela faria se eu desse um passo em sua direção. A marotinha sorriu, disse que não entendeu o que eu estava falando. Com as pernas tremendo, coração batendo rápido, e respiração tensa, dei um passo em sua direção. Ela recuou, e sorriu. Perguntei de novo: "se eu der mais um passo?". A marota sorriu de novo, e novamente recuou, mas um pouco menos. Ela queria jogar.

Na dúvida, decidi arriscar uma brincadeirinha, arriscar desencanar no meio do jogo. Sorri preparei para dar meia volta e disse: "tudo bem". Ao lentamente ir virando, ela ameaça dar um passo e aí eu paro, olho para ela. E arrisco meter a cara no beijo.

Ela me dá um empurrão, como se fizesse uma rejeição, mas com um sorriso. Aí não tive dúvida de que era preciso "dançar" aquela música. Disse que precisava ir, e qual não foi a surpresa ao ser puxado? Confesso, naquele dia peguei uma raiva desses joguinhos de empurrar e puxar.
 
Há certos momentos em que o não arriscar é a melhor opção, especialmente quando há a intenção em um momento futuro com determinada flor. Para dar esse exemplo, contarei o início de minha saga com a flor de laranjeira.

A Flor de Laranjeira é sensacional, pele macia, sorriso aberto, espontâneo, olhos de mel... todavia houve um problema, a conheci na época em que estava apaixonado por Violeta.
Flor de Laranjeira apareceu na minha vida em uma reunião ordinária do grupo de jovens, a qual simplesmente conheci de vista, mas sem grandes aproximações. Certo dia, realizamos uma atividade conhecida por missões, com visitas nas casas, conversas com as pessoas e uma série de atividades fascinantes. Flor de Laranjeira era minha parceira de missões, com quem comecei a conversar sobre um monte de coisas.

Em certa altura da caminhada, ela falou dos conflitos que estava tendo com o cara com quem ficava, ao que eu respondia com minhas opiniões, hora elogiando o cara, e na maior parte do tempo metendo pau nele. Aos poucos um sorriso abria-se nos seus lábios, e ela disse-me: "ele deveria ser que nem você", aproximando-se de mim. Todavia, eu idiota, apaixonado pela pilantra, à época, uma flor que só me espinhava, não queria "trair" Violeta. Trair com aspas porque nunca beijei os lábios de Violeta, tratando-se de "trair" a paixão que existia em minha cabeça.

Voltando ao caso, embora meus lábios e até a unha de meu minguinho conspirassem para que eu beijasse Flor de Laranjeira, não me perdoaria se assim agisse sentindo o que sentia por Violeta. Não sendo tão idiota quanto eu pensava ser, olhei nos olhos da flor que me cativara e disse: "linda flor, a coisa que mais anseio agora é dar-lhe um beijo intenso na boca, mas acho que assim poderíamos estragar essa amizade tão linda que começamos a desenvolver". Vali-me de minha insegurança para garantir uma não ação: quebrei o mistério.

O mistério quebrado é algo fatal para a sedução, pois troca o terreno da dúvida pela certeza, ficando exposto a moral, os desejos anteriores, os preconceitos... Flor de Laranjeira talvez responderia de modo afirmativo ao beijo se apenas o fizesse sem falar nada, todavia se viu relutante por ter colocado as coisas daquele jeito. Como nos conhecíamos a pouco tempo, ela também não arriscou naquele momento. Apenas consentindo com um silêncio e a continuada a caminhar.
 
No meu período de experimentação de safado, conheci uma menina do meu curso técnico com quem me dava muito bem. Era uma bela flor, todavia não pude tocar em suas pétalas, apenas vivenciar um fora especial, para não dizer idiota.

Tudo ocorreu quando teríamos uma aula extremamente pé no saco em uma sexta a noite. Naquela noite estava acontecendo no centro da cidade uma festa típica do bairro, não lembro exatamente do que, mas tinha um monte de barraquinhas vendendo pastel, cachorro quente, e tinha umas bandas tocando, 2002 ainda...

Estava nessa festa eu e essa bela flor, na qual "decidi" investir. Digo isso entre aspas porque fui com uma tal vontade que era como se eu estivesse pedindo desculpas por chegar mais perto dela. Ela olhava, sorria, e me perguntava se estava tudo bem. Nisso, bem ao estilo "calça cagada", perguntei se ela não queria ficar comigo. Bem, é óbvio que tomei um não na cara.

A riqueza daquele fora, apesar de ter me sentido o mais idiota dos idiotas, foi ter aprendido sobre a sensibilidade das mulheres: mesmo que você tenha um puta plano na cabeça pra chegar numa garota, se você não confia nele, a mulher saberá isso na mesma hora. As posturas estúpidas que eu tive de "pedir pra ficar comigo", em um tom de voz como alguém que está pedindo um favor, se não desculpas, rebaixou a relação de sedução a uma relação de esmola, de alguém que mendiga um favor, um beijo. A noite serviu para tomar um bom quentão, aliviando o desejo carente de meus lábios.
 
Uma das coisas que mais a gente teme, e contraditoriamente é a o que nos dá mais segurança na sedução, são os "foras" que a gente leva: "ai, não sei...", "vamos ser só amigos?", entre outros.

Fazendo uma analogia com a arte marcial, a primeira coisa que aprendemos antes de dar os golpes é cair no chão. Isso mesmo, cair no chão: levantar, cair, levantar, cair. Quando a gente leva um fora, apesar deste carregar-nos com uma marca de rejeição ("não me quiseram"), nós fazemos um rico exercício que foi o teste da suposição, isto é: confirmei se a atração entre eu e ela (no meu caso) era de fato tão intensa a ponto de rolar aquele beijo de sair faíscas. E como dito anteriormente, se não arriscamos, temendo o fora, já o fazemos de modo antecipado: aniquilamos nossa chance enganando-nos de que "eu não estava tão a fim".

Oh tonterias, oh pressupostos da maldita segurança. Seduzir só tem sentido porque não estamos no mundo das certezas, das determinações; vivemos no meio das condições e possibilidades. Sou feio, e isso é difícil de contornar. Mas posso ser sensual, atraente, simpático, carismático. E é essa incerteza e possibilidade da vida que me permite, mesmo sendo feio, ter sucesso, viver a vida, ser feliz. Outra hora discutiremos o conceito de feiura.

Assim, da mesma forma que temos chances, ainda que quase certas, de levar um NÃO; do mesmo modo existem chances de levar o SIM, que não virá bater na nossa porta com um cartaz "por favor, eu estou louca pra ficar contigo.".

Meus caros, isso é ilusão. Os mistérios são tão prazerosos porque nos deixam em dúvida, não são nos dão respostas 100% exatas.
 
A carta que Violeta me entregara pedia desculpas pela forma como havia me tratado no começo, e que sentiu saudades de coisas que eu dizia e de minha pessoa. Na época eu era muito imaturo para entender como se davam esses mecanismos de saudades e enjôos na sedução. Achei que Violeta apenas havia perdido "seu brinquedinho" e agora o queria de volta. Ah Violeta, desculpe minha infantilidade.

Fui infantil porque quis "pagar na mesma moeda" a dor que eu senti: agi com indiferença com Violeta, disse de modo educado que li a carta e que não achava que tínhamos de conversar algo por hora. A reação foi pesada, Violeta tentou aproximar-se novamente, e eu acabei agindo de modo mal educado com ela. Sequer cogitava uma possibilidade de vivenciar aquilo tudo que há meses atrás idealizava. De um pedestal levei Violeta para a mais baixa categoria de ser humano. Bem meus caros, se querem uma confissão: sim, eu fui f.d.p. com ela, mesmo que tivesse o cuidado de não ficar com alguém na frente dela, valia-me de minha nova "independência" para vingar-me de Violeta. Afinal, agora que estava em uma nova fase, de liberdade, deveria cuidar-me para não "retroceder". Aprendi um meio de "curar-me" de minhas desilusões, todavia esse método corresponde muito mais a um assassino de sentimentos do que uma pessoa livre. Perguntava-me se minha nova postura de safado era livre ou apenas descontava em outras flores a dor de espinhos que eu escolhi meter a mão? O tempo me disse que novas chances de cuidar de flores e espinhos seriam possíveis sem agir dessa maneira infantil.

A saber, houve um dia em que tive uma recaída e saí com Violeta, foi sensacional, todavia não consegui entregar-me a vontade louca de beijá-la, pois não me sentia bem com esse ar de vingança que pairava sobre minha cabeça (isso faz 8 anos). Colocamos em pratos limpos esses sentimentos paradoxais e viramos grandes amigos, e ela continua igualmente bela até hoje.
 
Sem expectativas com Violeta, angustiado por ser rejeitado, acolho a máxima de meu mestre Zeca Nato: "mulher gosta é de cara safado!", que motivou-me a arrumar alguma maneira de esquecer essa paixonite que tinha. Seguindo os passos de meus mestres, iniciei o execício básico de arrumar o visual. Geralmente a gente é meio relaxado na vaidade quando se trata de fases deprê, esquecendo que já estamos com um rosto abatido, barba mal feita, cabelo bagunçado. Além de voar em busca de outras flores, tinha de lidar com a maior prova de fogo, superar minha dependência com Violeta.

Por mais que nos digam um novo amor cura o velho, a possibilidade do novo amor constituir-se depende de uma liberdade de nos entregar de cabeça a novos relacionamentos. De renunciar os "e se..." que nos prendem ao velho, às velhas páginas, às fotos rasgadas e momentos que não voltarão. Do contrário, o mais provável será a repetição de episódios infelizes como os meus primeiros meses de Zeca, no qual ficava frente a frente com meninas fantásticas e pensando: "mas se Violeta de repente...". Ah voz idiota, consciência idiota. Prendia minha expectativa a uma imagem ideal de relacionamento que não existia.

À medida que rompia esse "e se.. " e beijava outras flores, os Zecas tratavam de divulgar a "fama" do novo Zeca, eu, a fim de tirar um sarrinho. Lembro que até brincávamos de chamar um ao outro de "safadão". E de certa forma me sentia meio confuso em como lidar com aqueles choques das meninas: "nossa Floreiro, você não era assim...". Até o dia em que uma cena chocou-me profundamente: Violeta entregou-me uma carta e pediu para que a lesse.
 
Retomando nossa pergunta inquietante, conto a experiência que vivi com Violeta. Violeta foi aquela linda flor por quem comia um caminhão de terra, e que me rejeitou. Na época xinguei-a de todos os palavrões que vinham à minha cabeça por ter me rejeitado, e mais ainda pela forma como ela marcou sua posição: convidando-me junto com outras pessoas para uma festa em sua casa e fazendo questão de ficar com outro Zeca na minha frente. Digo, poderia ser o acaso não fosse a questão de ela olhar em meus olhos e certificar-se de que eu estava vendo-a beijar o cara; e depois, na hora da despedida, pedir-me perdão por "qualquer coisa que tenha feito".

Antes que meus colegas queiram chamar violeta de vaca ou o Zeca de traidor, cito que eles não são vilões da história, e que apesar de eu tê-los chamado de f.d.p. por muito tempo, devo agradecê-los por terem me curado de paixonite.

Mas que é essa tal paixonite? É aquilo que acontece quando um homem desenvolve pela mulher uma espécie de atração tão idealizada a ponto desta tornar-se uma espécie de "salvação" para ele. À medida que essa visão idealizada da mulher se desenvolve, o homem começa a agir de um modo tão carente e inseguro que acaba afastando essa mulher de si. E quanto mais ele tenta "aproximar-se", mais ela foge.

O que acontecia entre eu e Violeta é que eu a achava linda, maravilhosa, encantadora; impressões típicas de um apaixonado. Olhava apenas as belas impressões dessa flor, sem considerar seus espinhos. E ao tentar abraçá-la, revelar-lhe o que sentia, aproximei-me como um doente aproxima-se de um médico. Todavia os humanos não necessariamente curtem cuidar da vida de pessoas que "não vivam sem ela", e é claro: Violeta preferiu manter distância de mim.

Inseguro quanto à sua frieza, decido aproximar-me mais, ser mais incisivo. Ela me tratava cada vez de modo mais frio, a fim de evitar criar expectativas de que ela fosse minha salvadora. A ponto de ter me mostrado de modo bem direto que estava em outra.

É óbvio que a xinguei muito e chorei uma noite inteira, pois todos meus castelos de areia desmoronavam, e mais ainda, a minha salvadora tornara-se um demônio, desprezível, que fazia questão de certificar-se de minha desgraça. A duras penas descobri que os humanos não se resumem em simples categorias como bem e mal, anjos e demônios. E digo, naquela noite Violeta abria-me a possibilidade libertar-me de minha paixonite e experimentar a vida temporária de safado.
 
Na copa de 2002 os jogos passavam por aqui durante a madrugada, sendo muito comum a gente se reunir na casa de alguém pelas 22h e ficar fazendo festa até a hora do jogo, perto das 2h da manhã.

Assisti o primeiro jogo do Brasil na casa de uns vizinhos, amigos de infância. Lembro que assim que cheguei na casa conheci Margarida, aquela flor carismática, que estava tomando uma cerveja e fumando um cigarro. Ela me olhou e apenas deu "oi", sem se apresentar, mas me dirigindo um olhar como se esperasse que eu fizesse alguma coisa para continuar a conversa sem me limitar a repetir um "oi". Idiota, eu olhei para seu cigarro e disse: "nossa, eu não sei fumar, queria aprender". Curiosamente, ela abriu um largo sorriso e perguntou: "você tem certeza? Isso aqui vai te deixar com um mal hálito e te matar". É óbvio que no fundo eu não estava a fim de aprender a fumar, mas foi o jeito que encontrei de puxar assunto, e o curioso foi que deu certo, pois ela se apresentou e perguntou meu nome.

Apresentações feitas, fomos para o lado de fora da casa onde ela me explicou os pressupostos "técnicos" do cigarro, e o curioso é que enquanto ela me ensinava o que era tragar, acender o cigarro, ela ria... de certa forma ela entendia claramente qual era a minha real intenção, e talvez por achar aquilo tudo divertido, dava corda para aquela "aula".

De tempos em tempos começaram a surgir perguntas do tipo: "você tem namorada?" ou "você curte fumantes?". Respondia meio que na distração, tentando disfarçar que eu estava a fim, na verdade tentando esconder meu exagerado interesse e insegurança de ela de repente enjoar de mim. Quando trata de sedução, sempre é bom ter um certo mistério, um ar de "não sei", "pode ser". Embora as definições claras sejam necessárias em determinados contextos, afastam as possibilidades. Acho que se eu mostrasse um interesse exagerado, ela não acharia mais tão divertido.

Ah gente, naquela noite o beijo foi lindo, Margarida era serena, sem violência de língua, e permanecia no beijo por muito tempo... só tinha um problema: descobri o quanto o gosto de cigarro na boca pode matar o sabor do beijo. Até mesmo Margarida tinha suas pétalas desagradáveis.